Que balanço faz do ano literário de 2022 nos Açores?
Foi um ano riquíssimo nos Açores quanto a produção literária, em todos os géneros. Acho que somos únicos no país quando comparados com outras regiões de igual dimensão: uma grade editora que dá pelo nome de Letras Lavadas, da Nova Gráfica em São Miguel, assim como a Companhia das Ilhas, no Pico, e ainda outras pequenas editoras que vão publicando a um ritmo mais reduzido, mas que contam muito para a nossa produção literária, como a Artes e Letras da Livraria Solmar. Junte-se a isto as livrarias de porta aberta, pelo menos em Ponta Delgada, Angra do heroísmo e Pico, e apesar das queixas de sempre não passa uma semana sem um ou mais lançam, veio também dignificar a nossa melhor literatura, não só o livro vencedor, como muitos outros por acréscimo.
Surgiu alguma obra que tenha merecido a sua atenção especial?
Sim, algumas. Menciono aqui, por agora, duas, uma de poesia e outra de ficção. Avenida Marginal, Poesia (recenseada ainda hoje também no Diário Insular) pela sua diversidade de poetas presentes, não só das ilhas como de outras partes do país. Sete Cartas de Artemísia, de Henrique Levy é uma obra notável em que a representação da mulher está no centro da sua temática. Claro que há outros livros que merecem o destaque na nossa imprensa, mas é difícil acompanhar toda esta produção literária quando são poucos a dedicarem-se à crítica literária, ou mesmo ao jornalismo literário lato sensu. Temos já três gerações no ativo, e que contam com notáveis escritores. Não vou mencionar mais nomes aqui, mas estão todos eles espalhados por várias ilhas, e alguns deles residentes ou a estudar nas nossas universidades.
Quanto a jovens escritores. Temos boas referências em crescimento?
Sim, temos. Leonardo Sousa já deu provas de si em pelo menos dois livros de poesia, o mais recente intitulado Contas de Cabeça, em que o jovem micaelense, agora estudante na Universidade Nova de Lisboa, alia o classicismo de todos os tempos a uma modernidade quase sem igual entre nós. Haverá outros a merecerem a nossa atenção, mas guardemos isso para outra oportunidade e espaço nestas páginas. Desde escritores ainda na casa dos vinte anos idade, aos que estão entre eles (Joel Neto e Nuno Costa Santos, só como dois exemplos) e a minha geração, não ficamos a dever nada a ninguém. Muito pelo contrário. Retirem os açorianos do cânone literário nacional, e falo desde Gaspar Frutuoso, do século XVI, até aos nossos dias, e verão a sua gritante diminuição e desvalorização.
Os festivais literários, nas suas várias formas – incluindo festas literárias, etc. – são tidos como importantes para avaliar a vitalidade do setor. Nesse particular, como vamos nos Açores?
Muito melhor do que dizem algumas vozes entre certos intelectuais na generalidade. O Outono Vivo, da Praia da Vitória, agora retomado depois da pandemia, é dos melhores festivais culturais e literários do nosso país. Tem dado a voz e divulgação a muitos escritores açorianos. A sua Feira do Livro é algo de admirável. O Arquipélago de Escritores, dirigido por Nuno Costa Santos e Sara Leal, agora com sede, por assim dizer, em Angra do Heroísmo, também se tornou algo de inédito entre nós, anualmente dividindo as suas sessões por duas ou mais ilhas com escritores vindos de toda a parte de Portugal. De resto, as nossas Bibliotecas e Arquivos Regionais mantêm uma atividade constante, desde o lançamento de livros a encontros literários, comemorativos da nossa memória coletiva nos contextos regionais e nacionais.
Outra questão que me parece muito pertinente quanto à literatura que tem os Açores como referência. A América do Norte tem já um substancial grupo de escritores e poetas de renome nos seus próprios países, mas que se recusam a não fazer chamamentos constantes às suas raízes ancestrais. Trata-se de segundas e demais gerações nascidas nos Estados Unidos e no Canadá. Escrevem em inglês – mas pertencem por inteiro à nossa grande Tradição literária – pela historicidade e temática de todas as suas obras. Duas editoras nos EUA estão a dar conta de tudo isto: A Tagus Press, da Universidade de Massachusetts, e a Bruma Publications, da Universidade Estadual da Califórnia, em Fresno.
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